quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Música e expressão pelo movimento/ Entrevista com Daniel Reginato.

No dia 14/06/2011 enviei algumas perguntas via Skype e fiz a primeira parte da entrevista com o Daniel Reginato pelo Skype e a segunda parte pessoalmente na Oficina de Canto Coral com base no repertório folclórico na Oficina Cultural Alfredo Volpi em Itaquera.

Isaac Alves: Como você vê que o corpo se mostra nas aulas de música tradicional? E como deve ser em um ensino "holístico"?
Daniel Reginato: O que você entende como holístico?
Isaac Alves: no sentido de que o corpo também faz parte do ensino e não somente o mental que é o que a educação enfocava e ainda enfoca.
Daniel Reginato: Na prática tradicional. Onde teoria musical era ensinada pelo mesmo professor do instrumento. O corpo só é solicitado para conduzir uma regência. No caso do solfejo. Lembro-me de ter feito o Bona e o Pozzolli e que os professores enfatizavam a questão da regência para eu saber quando estava no compasso. Era só. Não existia um movimento ou preocupação dos professores para trabalhar questões como prontidão. Ou até ajustes de relaxamento muscular para tocar sem tensão.
Isaac Alves: Ok! Eu também tive essa mesma prática cruel.
Daniel Reginato: Já, atualmente ainda existe uma enorme lacuna e carência para se ensinar música para adultos sem necessariamente passar por um instrumento. Os cursos ou são de interpretação (coral, instrumento e etc...) ou são de apreciação musical. Quando há o corpo envolvido os professores tendem achar que é muito lúdico. E que só serve para a criança.
Isaac Alves: Concordo, inclusive muitos adultos musicistas pensam assim.
Daniel Reginato: Mas depois que percebi que precisava reativar a memória corporal das pessoas. Uma memória do corpo ativo. Entendo e projetando os conceitos que quer fixar. (Entendo e projeto no corpo os conceitos que quero fixar.) O Dalcroze fala do eixo tempo x energia. Para se tocar ou cantar bem. Você deve estar conectado com seu corpo. E tem de entendê-lo como uma extensão de sua própria possibilidade expressiva. Para mim não tem como falar de música sem falar de movimento.
Isaac Alves: Que beleza com apenas uma pergunta você esta me respondendo várias questões que tinha que fazer. Como já tinha conversado com você em outras aulas, já sabia que sua prática envolve o corpo no fazer musical. Isso é ótimo. Então é um pouco do que já conversamos mesmo.



Música e expressão pelo movimento/ Entrevista com Daniel Reginato. II
Segunda parte da entrevista com o Daniel Reginato.
Isaac: Como você já falou sobre sua iniciação musical que começou sem movimento corporal, ou seja, sem inserir o corpo integralmente e teve a iniciação musical com o Bona e outros métodos similares que o máximo de movimento que fazia era com as mãos marcando o compasso. Como você chegou a essa prática que envolve o corpo e busca o movimento dele como um todo nas aulas de música que ministra e como você começou utilizar o método “O Passo”?

Daniel: Como meu trabalho é mais ligado ao canto sempre tive uma atividade corporal mais sistematizada principalmente durante as minhas aulas. Em um dos cursos que fiz no Rio de Janeiro (promovidos pela RIO A CAPPELLA) tive conhecimento de uma ferramenta de percepção que propiciava aos cantores que não tinham leitura musical entender conceitos fundamentais de ritmo seu nome era O PASSO. Na época trabalhava com um regente chamado Eduardo Fernandes (CORALUSP, Coral UNIFESP) que começou a usar o método em seus ensaios. Entretanto, usava de maneira especifica, ou seja, para resolver um problema especifico que um determinado naipe apresentava, já que o contexto estava voltado para a interpretação. Porém, mais tarde, na Escola do Auditório Ibirapuera, onde eu regia um grupo juvenil, o método passou a ser adotado através de um curso de formação, e assim conheci o Lucas Ciavatta, criador do método. Já conhecia um pouco sobre o assunto e na época pude me aprofundar nessa temática. Então entendi o que era “O Passo”. Na época o Lucas disse que desenvolveu o método para que ele pudesse suprir as necessidades que ele encontrou ao começar estudar música, já muito tarde. E ela possibilita que todos sem exceção, cheguem à compreensão rítmica. Depois de um ano a escola adotou o método como esqueleto da aula de percepção, pois até então eram feitas aulas de percepção e teoria da forma mais próxima da metodologia tradicional e cerebral, sem a presença constate da consciência corporal. “O Passo” era usado aparentemente somente para resolver problemas rítmicos. No ano seguinte “O Passo” tomou uma direção muito grande na escola, não somente a mecânica, mas toda a forma de introduzir a música e o critério de como usar O Passo que o Lucas baliza ao pensar educação musical. Então, a escola convidou-o para criar um núcleo de percepção com o que ele achasse ideal para a formação de músicos e como eu já trabalhava com “O Passo” em um outro grupo que regia, ele me chamou para trabalhar. A partir de então a escola do Auditório passou a ter uma matéria chamada Canto com O’PASSO, que era uma aula de afinação, onde existe uma prática do solfejo melódico e harmônico. Essa disciplina tem como base a reflexão minha e do Lucas dos processos e caminhos inerentes a uma consciência da afinação. Estão presentes as ferramentas do O’PASSO como a marcação do pulso quando existe uma necessidade de leitura de trechos ou mesmo a própria filosofia de trabalho do método, principalmente no rigor das fases de apreensão do conteúdo.
Voltando ao assunto do corpo lembro-me também que me aproximei de outra linha pedagógica musical que associa a utilização do corpo no aprendizado. Por volta de quatro anos atrás em um simpósio de educação musical conheci as técnicas propostas pelo Suíço Emile Jacques Dalcroze. Através do prof. Iramar Rodrigues que leciona em Genebra pude vivenciar na prática, soluções em sala de aula onde o corpo faz parte do aprendizado e é convidado como tradutor da percepção musical em todos parâmetros sistematizados. Lembro de Iramar sempre repetir: “tudo é movimento”. Então, fiz a conexão de que esse uso do corpo também influenciaria no resultado da sonoridade dos coros, e que também funcionava como solução necessária para pessoas que desejavam um estudo musical calcado em uma abordagem mais sensorial.

Isaac: Vejo que para você o corpo é muito importante para a pratica musical, pois você não o dissocia da mesma. O que você vê na educação brasileira musical, o enfoque no corpo cresceu ou ainda falta muito para a introdução do corpo na música erudita?

Daniel: Você esta falando da educação musical para crianças, para adultos ou para o ensino de instrumento?

Isaac: Vamos focar no ensino do instrumento.

Daniel: Existe uma grande resistência de usar O PASSO, de incorporar e estabelecer o tempo inteiro a medida (o movimento) corporal na educação musical para os professores de instrumentos, mesmo dentro da Escola do AUDITÓRIO, onde o método é oficialmente adotado. Temos excelentes professores instrumentistas e não são todos que usam O PASSO nas aulas técnicas. Eu diria que tem uma resistência absurda. A maioria não usa.  Na verdade no contexto do método “O Passo”, ele visa resolver um problema rítmico, porém, a maioria dos professores estão preocupados em capacitar os alunos a conseguir executar tecnicamente o som do instrumento. A questão está incialmente ligada ao tipo de contexto em que aula se baseia. Percebo que, no entanto, eles não utilizam o PASSO para a resolução de uma leitura simples de um exercício de técnica, mas sempre apresentam uma solução corporal para falar de sonoridade obtida pelo instrumento, seja ele qual for. O ensino de instrumento na música popular incorpora muito a questão corporal. Essa questão de usar ou não o PASSO, lembro-me do Lucas “o passo existe para resolver uma necessidade e se você consegue estudar sem ele, então não precisa usá-lo”.  Eu que estudo piano desde os nove anos de idade, em um dos últimos cursos que fiz, deixei uma preocupação o tempo inteira voltada para a mobilidade do corpo no piano. Existe uma coisa nova no piano que é o professor falar do apoio respiratório, que é educar o ataque, não tencionar a mão. Durante meus cursos de instrumento quando era mais novo não ouvia sobre isso antes e isso é um nível de refinamento. Porém, se observarmos os bons professores de antigamente, de forma empírica, buscavam fazer alguns ajuste corporais visando uma integração melhor entre o corpo e a mente no momento da execução musical.

Segue abaixo o endereço de um vídeo do Lucas Ciavatta falando sobre "O Passo".

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Educadores Brasileiros


Minhas Impressões 

Alguns eu nunca tinha ouvido falar, outros já conhecia alguma coisa, mas como o nosso tempo de aula é limitado apenas demos uma lida ou fizemos algum exercício desenvolvido por esses educadores. Entretanto foi o suficiente para despertar em nós o interesse por nos aprofundarmos mais e conhecermos um pouco mais do que os educadores brasileiros já desenvolveram em relação à música. Nossos educadores são muito bons, competentes e desenvolveram metodologias embasadas em nossa realidade brasileira. Vale muito ter o contato com essas metodologias e para quem tiver interesse em pesquisar e conhecer segue abaixo o nome dos grandes educadores musicais brasileiros que foram abordados em nossa aula, mas, ainda faltam muitos nomes que posteriormente poderão ser adicionados.

  • Anita Guarnieri
  • Bohumil Méd
  • Cacilda Borges
  • Carmem Maria Mittig Rocha
  • Gazzi de Sá
  • Gramani
  • Jurity de S. Farias
  • Liddy Mignone
  • Maria de Lourdes Junqueira
  • Osvaldo Lacerda
  • Villa Lobos

O Educador Musical JOHN PAYNTER (1931 – 1996)



O inglês John Paynter foi educador musical em escolas regulares e também naUniversidade de York. Ele questionou a educação musical que vivia embasada na música do passado e por isso suas características se distanciam da vida cotidiana. Sua pedagogia é de que a música é possível á todos, pois oferece diversas possibilidades para trabalhar atividades e não precisa ser um especialista para isso. Seu ensino é embasado na música de vanguarda (música ocidental erudita de concerto 1940 a 1990), experimental e na escuta ativa em sua prática oferece condições aos alunos de fazerem suas próprias criações e também associava a música ao teatro e as artes visuais. Segundo Paynter para ensinar música não precisa de método, pois ele considerava os métodos a “antítese da mente criativa”. Portanto,  ao invés de criar um método, propôs a construção de um rede de relações de estudos diversificados que geram outros estudos diversificados por meio das experiências pessoais. Para John Paynter existem quatro procedimentos que centralizam a prática musical: os sons na música, as idéias musicais, o pensar e fazer musica e os modelos de tempo. Esses  quatro procedimentos resultam em projetos, pois cada um deles esta ligado ao outro por meio de diversas atividades que formam uma rede complexa de interações que tem um ponto central chamado de resposta e compreensão. Pensando em uma rede, ou uma teia, os quatro procedimentos chamados de projetos podem ser começados em qualquer direção, durar uma aula ou mais e independentemente de onde comece, sempre deve passar pela resposta e compreensão que é o ponto central do entendimento musical. O pensamento em rede é o que diferencia essa prática dos métodos desenvolvidos linearmente na primeira metade do século XX e esse pensamento em nossos dias é bem contemporâneo. John Paynter publicou diversos livros sobre educação musical que defendem seu pensamento e embasa seu trabalho nas descobertas e conquistas da psicologia do desenvolvimento da época, fazendo com que a música tenha sentido e significado no mundo em que vivemos. Citamos aqui três de suas importantes obras: Sound e Silence (1967), Hear and Now (1972), Sound and Structure (1991).

O texto acima foi embasado no livro De tramas e fios: um ensaio sobre a música e educação de Marisa Fonterrada 2001. p.124.

Minhas impressões sobre as atividades que desenvolvemos na aula em relação aos projetos de Paynter foram muito positivas, pois como os outros educadores da segunda metade do século XX ele promove o despertar da criatividade porque a sua escrita delimita alguns parâmetros, mas proporciona uma interpretação muito ampla em relação ao trabalho sonoro, pois cada um de nós executamos e regemos as mesmas partituras, porém saíram músicas totalmente diferentes, novas, criativas e expressivas. Com certeza, todo educador musical de ter contato com a obra e os ideais que esses educadores musicais da segunda metade século XX desenvolveram, pois isso faz muita diferença na nossa prática cotidiana.

O Educador Musical GEORGE SELF (1921 - )


George Self faz parte da segunda geração de educadores musicais dos métodos ativos. Ele é professor de música em escolas de ensino regular na Inglaterra, é ligado a música de vanguarda, não concorda com o ensino de “música do passado”, pois a vê como “um adestramento musical dos alunos” pois, esse tipo de ensino é voltado para si mesmo em muitos casos. Na educação musical é a favor de que os alunos sejam estimulados a ouvir, criar e inventar novas escritas de partituras, tendo início com a escala cromática para conscientizar as crianças das variedades sonoras e não das alturas. Esse trabalho deve ser feito de forma coletiva, ou seja, todos juntos explorando as possibilidades de um determinado instrumento. A iniciação musical não deve enfatizar a pulsação musical e nem as alturas, mas sim explorar os timbres e as variedades sonoras.  George Self dá muita importância aos instrumentos artesanais e principalmente aos confeccionados pelos próprios alunos e utiliza também diversos instrumentos de percussão porque facilitam o primeiro contato e a exploração sonora dos alunos. As atividades desenvolvidas com os alunos não são convencionais e ele enfatiza e valoriza a exploração e a produção sonora pela pratica e criação em conjunto.
De acordo com o educador podemos classificar os instrumentos conforme os sons que produzem, ou seja: instrumentos que produzem som curto, pandeiro, claves etc; instrumentos de sons sustentados, cordas, metais e madeiras etc; e instrumentos de sons que se extinguem  aos poucos, piano, maracás, triângulos etc. A notação para ele pode ser simplificada, pois, valoriza os sons e os timbres, então deixa o ritmo livre da submissão ao pulso e a melodia livre das escalas e modos. Com essa liberdade do pulso e de alturas definidas a partitura pode ser interpretada de diversas formas. No início em relação à dinâmica utiliza somente os sinais de (f) forte e (p) fraco. A escrita de sua partitura é representada por pontos  que representam sons curtos, ponto e linha curva para representar um som tenuto, linha em zigue-zague para representar um tremolo e diversos outros sinais para os demais sons. Após o desenvolvimento desse trabalho com os alunos se quiser trabalhar com a “música do passado” fica fácil porque muitas propriedades do som foram trabalhadas ouvindo, tocando, criando e lendo. Portanto, a transição para a leitura da partitura convencional pode ser feita a partir de uma linha com uma determinada clave, três notas diferentes e os sinais de intensidade (f) e (p). Em pouco tempo e com um mínimo de sinais os alunos já podem no início de sua prática musical com a “música do passado” criar e ler frases musicais feitas por eles mesmos o que torna o ensino e a aprendizagem musical mais criativa e significativa com a realidade dos alunos.

O texto acima foi elaborado com base nos livros “De Tramas e Fios” de Marisa Fonterrada e “O Ouvido Pensante” Murray Schaeffer

As atividades que desenvolvemos com algumas partituras do George Self foram muito esclarecedoras, divertidas, diferentes e criativas de fazer, pois cada um que se dispunha a interpreta-las fazia de forma diferente em relação a duração aos timbres e as alturas porque esse tipo de escrita possibilita essa abertura. Os momentos das atividades com as partituras do Self  deram-nos muito prazer e foram produtivos para nós adultos. Penso que o mesmo ocorre em uma sala de aula, pois, este tipo de música e escrita musical proporciona momentos de realização em grupo e individual. Ainda permite a expressão, criatividade e condução das atividades por cada indivíduo do grupo, além de desenvolver também a socialização dos alunos, pois existem alguns combinados que temos de seguir como indivíduos dentro do grupo para que a música aconteça num todo.